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Após trocar o comando da Petrobras, o presidente Jair Bolsonaro disse que vai interferir na energia elétrica. A medida, embalada por um desejo de melhorar a sua popularidade diante da crise econômica no país aparentemente visando as eleições de 2022, pode trazer consequências para o setor a longo prazo e para a arrecadação dos estados e da União.

No último sábado (20), depois de anunciar a troca no comando da Petrobras, Bolsonaro disse que ia “meter o dedo na energia elétrica, que é outro problema também”. Logo depois dessa fala, começou uma especulação sobre as medidas que seriam tomadas pelo governo, sendo duas delas mais possíveis — a antecipação do crédito tributário e a privatização do controle da Eletrobras. 

É evidente que as tarifas de energia elétrica terão um aumento significativo no reajuste tarifário deste ano por conta das medidas emergenciais de alívio aos impactos da pandemia da Covid-19. Todos os anos, as tarifas já passam por reajustes, que levam em consideração diversos fatores, como a inflação, a alta do dólar, as condições climáticas para a geração de energia e a inadimplência dos consumidores (intensificada em momentos de crise), por exemplo. 

Mas, a pandemia do coronavírus, gerou um déficit para as distribuidoras causado pela suspensão do sistema de bandeiras tarifárias, do corte de energia elétrica por inadimplência e da isenção de 100% da conta de luz de famílias enquadradas na Tarifa Social por três meses, o que pode influenciar no aumento da tarifa de energia elétrica.

Algumas ações estão sendo executadas para que esse aumento não seja repassado de uma vez para os consumidores. A Resolução Normativa 885/20 da Aneel, conhecida como Conta-Covid e aprovada em junho de 2020, por exemplo, é uma das iniciativas que surgiu para aliviar a queda de demanda e o aumento da inadimplência, uma vez que o consumo caiu e muitos pagamentos foram interrompidos na pandemia. 

Através dessa resolução, foram oferecidos empréstimos, por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para as empresas de energia elétrica no valor de R$ 16,1 bilhões. Esse montante deverá ser pago ao longo de 60 meses. 

Após o anúncio de interferência feito no sábado, a expectativa é que Bolsonaro adote uma medida imediatista para reduzir a tarifa de energia, evitando um aumento significativo da conta em 2021. O governo pode forçar, por meio de medida provisória, que as distribuidoras antecipem a maior parte do crédito tributário recolhido indevidamente para os próximos meses. O valor estimado supera os R$50 bilhões.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) havia sinalizado nas últimas semanas que pretendia diluir esse valor em cinco anos, para que a tarifa de energia ficasse mais barata a longo prazo. Mas o que Bolsonaro quer, no momento, é realizar essa diluição em menos tempo. Se for concretizada, a ação pode prejudicar a arrecadação dos estados para o período, que estão com dificuldades financeiras, e da União.

Uma outra medida, confirmada pelo presidente e publicada no Diário Oficial da União na última terça-feira (23), é a privatização do controle da Eletrobras, estatal criada para operar em diversas etapas do setor elétrico brasileiro. Estima-se que o governo poderá usar até R$ 20 bilhões da venda da estatal para propor a redução de tarifas de energia.

As consequências de interferências nas tarifas de energia no setor elétrico, contudo, não seriam uma novidade no Brasil. Durante o governo de Dilma Rousseff, em 2013, pouco antes da campanha de reeleição, a presidente decidiu arbitrariamente reduzir em 18% a tarifa de energia para residências e até 32% para indústrias. 

A expectativa de Dilma era baratear o preço da energia, por meio da modernização do setor com novas usinas de geração e linhas de transmissão, o que não aconteceu. Por isso, nos anos seguintes, o aumento da tarifa acelerou — 88% em cinco anos. tarifa média de energia com impostos

Em alguns estados, a alta foi ainda mais significativa, como é o caso do Rio de Janeiro, Espírito Santo e São Paulo, que tiveram aumentos de 110%, 106% e 94,62%, respectivamente, entre os anos de 2014 e 2020. 

O aumento do preço também fez com que muitos consumidores buscassem alternativas para reduzir os custos. No entanto, muitas destas soluções não possuem uma legislação equilibrada, ou seja, não geram uma economia sustentável para o setor elétrico. É o caso da geração distribuída que nesse mesmo período cresceu 543% no Brasil. tarifa de energia e unidades com SD

Nesse modelo de compra de energia elétrica, há um incentivo cruzado, que isenta os consumidores que geram a própria energia (como no caso de fazendas solares) dos custos de transmissão e distribuição. O prejuízo gerado por esse incentivo, no entanto, é pago por quem está no modelo convencional, aumentando ainda mais o preço da tarifa de energia.  

Dessa forma, acreditamos que uma intervenção nos preços de energia pode, a curto prazo, amortizar o impacto causado pela Covid-19 sobre os consumidores. Contudo, como percebemos no histórico recente do país, a tendência é de um impacto negativo, de um lado ou de outro. E, nesse caso, quem deve sentir são os estados e a União.

No cenário que vem sendo desenhado nos últimos anúncios do governo federal, fica claro que as propostas para resolver esses problemas a longo prazo são ainda mais urgentes. Iniciativas como a revisão da REN 482, que dita as mudanças no sistema de geração distribuída, e a PLS 232/16, que trata da portabilidade da conta de luz, são alternativas para corrigir as ineficiências regulatórias e reduzir o que todos os brasileiros pagam pela energia.